O grupo Dubai World, que está sob o controlo do Governo do Dubai, pediu um adiamento até "pelo menos Maio de 2010" da amortização das suas emissões obrigacionistas de 59 mil milhões de dólares (cerca de 40 mil milhões de euros ou um quarto do PIB português). Esta é uma das maiores ameaças de incumprimento no mercado de dívida das últimas décadas, apenas comparável com situações como as da Argentina nos anos 90, ou da Islândia em 2008.
O Emirado do Dubai, um dos sete que constituem os Emirados Árabes Unidos, tornou-se nos anos anteriores à crise financeira no símbolo máximo da euforia imobiliária a que se assistiu um pouco por todo o planeta. Ao pé da exuberância do mercado imobiliário do Dubai, a oferta de crédito fácil na Califórnia ou a construção em série de moradias no Sul de Espanha quase podem ser apresentados como exemplos de investimentos de baixo risco.
As autoridades do Dubai decidiram no início desta década que queriam fazer do território o novo centro financeiro, turístico e cultural do globo e não se pouparam a nada para consegui-lo. Desde a construção do Burj Dubai, o mais alto edifício do mundo, com 818 metros e inauguração marcada para o dia 4 de Janeiro, até à criação de uma ilha artificial em forma de palmeira, passando pela organização dos mais diversos eventos desportivos e culturais, o território foi surgindo no noticiário mundial como sinónimo de luxo e exclusividade.
Os problemas surgiram em 2008. Quando a crise financeira internacional atingiu o seu auge, os investidores, especuladores imobiliários e turistas milionários que tinham ajudado a sustentar o crescimento no Dubai viram-se forçados a regressar aos países de origem. A fuga de estrangeiros foi de tal modo volumosa e brusca que era possível notá-la observando os milhares de veículos de alta cilindrada que se encontravam abandonados nas ruas da cidade. Durante os primeiros oito meses de 2009, os preços do imobiliário caíram para metade e cada vez mais escritórios e apartamentos ficaram vazios, forçando ao adiamento de projectos no valor de 24 mil milhões de dólares.
Sabendo que todos os investimentos tinham sido feitos recorrendo ao mercado internacional de crédito, já se temia que começassem a surgir dificuldades no pagamento dos 80 mil milhões de dólares de dívidas. Mas havia a esperança que as autoridades de Abu Dhabi, o emirado mais rico (graças ao petróleo), continuassem a suportar os seus parceiros do Dubai. O anúncio ontem feito parece mostrar que esse apoio deixou para já de ser possível.
Ontem, por causa do Dubai, o clima de nervosismo nos mercados financeiros internacionais regressou em força. As bolsas caíram e as taxas de juro das obrigações menos seguras dispararam. Tanto na Europa como nos EUA, todos queriam saber quem é que tinha investido no Dubai e quais os próximos mercados a cair.
Portugal não escapa aos efeitos negativos. O impacto directo - que ocorre nos casos em que entidades portuguesas tenham adquirido títulos de dívida com origem no Dubai - é difícil de quantificar. Contactada pelo PÚBLICO, fonte oficial do Banco de Portugal, limita-se a dizer que "a situação está a ser avaliada".
Mas o impacto indirecto já se tornou evidente. Como os investidores, nesta situação de stress, se protegem nos investimentos mais seguros, as emissões de dívida feitas pelo Estado e as empresas portuguesas saem prejudicadas face, por exemplo, às das suas congéneres alemãs e, por isso, as taxas de juro suportadas por Portugal tendem a subir, algo que já aconteceu ontem (ver texto ao lado).