O livro de Pierrat está cheio de imagens, humor e sexo e incide sobre temas como a propriedade literária, a luta contra a censura, as reivindicações dos homossexuais, etc, dando da Justiça estatal uma imagem muito pouco complacente. A propósito dela fala-se por exemplo da arquitectura para impressionar, de toda a encenação processual, assim como da linguagem hermética que serve para melhor confundir: «A linguagem do Direito pertence à ordem do ritual, à teatralidade da justiça, tal como acontece com os trajes, os costumes e a disposição das salas de audiência»
Os profissionais da justiça não escapam às observações críticas do autor, e tanto os juízes, magistrados e advogados não escapam às suas invectivas, concluindo: «Invejam-se uns aos outros . Assim são as profissões do Direito».
Também não se coíbe de sugerir um remédio para a lentidão da justiça? «No fim do ano judicial, quando os magistrados tiverem que prestar contas à hierarquia sobre o número de processos já resolvidos,há que proceder a um verdadeiro abatimento dos litígios». Denuncia ainda a chamada «inflação legislativa» mostrando como as leis se sobrepõem uma às outras sem que os artigos obsoletos sejam eliminados: « Não toquem em nada, ou melhor, empilhem-se as leis, pois uma velha lei empoeirada sempre pode servir a qualquer momento».
O nosso autor mostra-se inquieto quanto às novas formas de censura, sob a máscara e por via dos grupos de pressão de carácter moralizador que têm normalmente um bom acolhimento junto dos tribunais. O advogadi deplora que o direito não seja utilizado para agitar as águas da sociedade, mas bem pelo contrário como mais um meio para travar as mudanças sociais.
Analisa-se ainda a verdadeira obsessão pelo sexo que hoje se regista nos assuntos judiciários, sempre segundo a óptica dos bons costumes, mas que acaba por se mostrar incoerente no modelo do código napoleónico seguido até hoje: «A lei não encara da mesma maneira as várias maneira da libido se expressar. As minorias sexuais e os «desviantes» não são iguais face à lei. Esta prefere os zoófilos aos pedófilos, os necrófilos aos violadores, os exibicionistas aos proxenetas…»
O livro está longe de constituir, na realiadade, um tradicional manual de direito. Nem era essa, assumidamente, a sua intenção. E muito menos era o de fazer uma teorização crítica do sistema jurídico moderno dos Estados-Nações. Mas não deixa imune as contradições e os impasses da justiça tal como hoje se pratica nos chamados Estados de Direito, e tudo isso com uma boa dose de humor e de iconoclastia visual.
ANTIMANUEL DE DROIT d'Emmanuel Pierrat. Ed. Bréal, 408 pages, 23 €.
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