A filosofia esotérica
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A filosofia esotérica



Os autores da Igreja se apropriaram da palavra "filosofia", que já estava em uso desde os primeiros séculos, para denotar nada mais nada menos do que o próprio Cristianismo. Para explicar e justificar essa apropriação, eles faziam uma distinção entre dois tipos de filosofia: (1) "filosofia exterior (exoteriké, éxo, thýrathen)" e (2) "filosofia interior (esoteriké, éso)". A filosofia interior também era chamada de "verdadeira filosofia", "filosofia celestial", "filosofia espiritual", "filosofia divina", "filosofia segundo o Cristo", "filosofia sagrada", "filosofia do Alto" e "sabedoria do Alto".

O primeiro tipo de filosofia ("filosofia exterior") corresponde à filosofia grega e à filosofia pagã dos primeiros séculos cristãos. O segundo tipo de filosofia ("filosofia interior") é idêntica à religião cristã. Este termo é usado para denotar a doutrina cristã ortodoxa em sua totalidade; a doutrina cristã viva; algumas práticas interiores, sobretudo a atenção interior e o silêncio interior; e a vida monástica.

A distinção entre "filosofia exterior" e "filosofia interior" pode ser encontrada já nos textos patrísticos gregos do século II. Esta distinção continua em uso na Grécia contemporânea.

A "filosofia exterior", por sua vez, é dividida em duas categorias: autêntica e falsa. Por exemplo, esta distinção aparece nas obras de Clemente de Alexandria, nos séculos II e III, nas obras do teólogo Meletios Pigas, no século XVI, e nas obras de São Nectário, no século XX. A filosofia exterior autêntica, a qual é inspirada pelo amor à verdade, teria como seus grandes expoentes os filósofos Sócrates, Platão e Aristóteles. Embora suas filosofias contenham erros, elas também contêm inúmeras e importantes verdades, e constituem o que Clemente de Alexandria chamou de "treino preparatório para aqueles que desejam atingir a fé mediante a demonstração", "alpondras para a filosofia segundo o Cristo". [1] A filosofia exterior falsa, por outro lado, teria como seus grandes expoentes os pensadores orgulhosos e superficiais: sofistas, materialistas, ateístas, escravos do prazer. É precisamente a pseudo-filosofia, segundo Clemente, a qual São Paulo Apóstolo se refere em Colossenses 2:8: Tende cuidado, para que ninguém vos faça presa sua, por meio de filosofias e vãs sutilezas, segundo a tradição dos homens, segundo os rudimentos do mundo, e não segundo Cristo. [2]

Pigas e Nectário, ambos admiradores de Clemente de Alexandria, também fazem uso dessa distinção. Pigas se refere a Sócrates e Aristóteles como sábios, aprovando sua filosofia, enquanto retratam Epicuro e seus seguidores como sendo animais irracionais, pois reduzem o homem a um animal, negando-lhe uma alma imortal. [3] Nectário cita Sócrates, Platão e Aristóteles como sendo verdadeiros filósofos, e os antigos materialistas, ateístas, hedonistas e sofistas como sendo falsos filósofos. Ele diz ainda:

Observem Sócrates, Platão, Aristóteles e Plutarco, e os demais trabalhadores da nobre filosofia. Que século se esquecerá deles? Quem não admirará a época em que viveram como sendo uma época de glória e grandeza? Mas observem também a companhia dos epicureanos. Que tipo de homens eram Diágoras, Aristipo, Hégias e assemelhados, os trabalhadores da antiga desgraça? Quais foram seus feitos? A história tem escrito páginas negras a seu respeito.[4]

A maneira correta para os cristãos fazerem uso da "filosofia exterior" foi dada nos primeiros séculos por Clemente de Alexandria em seus Stromateis, Basílio o Grande em seu Discurso aos Jovens e João Damasceno em sua Fonte de Conhecimento. Eles recomendam um uso eclético da filosofia exterior, selecionando dos livros pagãos aquilo que convém a um cristão e que fosse aliado da verdade, desprezando o restante. Tal ecletismo foi praticado continuamente no Oriente helênico, durante os tempos bizantinos, e durante o período pós-bizantino. Nunca tal filosofia foi condenada, como o fez Tertuliano, no Ocidente, que rejeitara a "filosofia exterior" em sua totalidade.

A distinção entre "filosofia exterior" e "filosofia interior" foi especialmente enfatizada nas épocas em que os secularistas se esforçaram em ignorá-la, promovendo a "filosofia exterior" de maneira unilateral e intransigente. Isso aconteceu na Grécia, durante os séculos XVIII e XIX, quando as idéias materialistas e ateístas começaram a se introduzir na Grécia a partir da Europa Ocidental. Athanasios Parios (1721/1722-1813), um dos maiores educadores da Grécia, reagiu com vigor. Ele escreveu e publicou em 1802 um livro chamado Réplica (Antiphónesis) [5], na qual enfatizou a distinção entre "filosofia exterior" ou "filosofia humana" e "filosofia interior" ou "filosofia divina". Ele identificou a primeira como sendo a antiga filosofia grega e a filosofia européia, e a segunda como sendo o ensinamento cristão, conforme contido na Sagrada Escritura, especialmente no Novo Testamento, nas obras dos Santos Padres do Oriente e nas resoluções e cânones dos Concílios Ecumênicos. Parios enfatiza, em sua Réplica, a superioridade da filosofia divina sobre a filosofia humana, do ensinamento cristão sobre os sistemas seculares de conhecimento. Ele afirma que, na Europa, a hierarquia natural, na qual a filosofia natural ocupa um lugar acima da filosofia exterior, foi desvirtuada, pois a filosofia exterior ocuparia um lugar acima da filosofia espiritual, interior.

[1] Stromateis, Livro I, Capítulo V, Livro VI, Capítulo VIII.

[2] Ibid., Livro I, Capítulo XI.

[3] Meletios Pigas, Chrysopegé ("Fonte de Ouro"), ed. G. Valetas, Atenas, 1958, p. 173, 225, 226, 265, 307, 311, 315, 322, 336, 345, 355, 385.

[4] Do meu livro Modern Greek Philosophers on the Human Soul, p. 85. Ver também São Nectário, Perí Alethoús kai Pseudoús Morphóseos ("Da Verdadeira e da Pseudo-Educação"), Atenas, 1894, p. 8-21.

[5] Antiphónesis, Trieste, 1802; 2a. ed., Hermoupolis, Syros, 1866.

Fonte: Constantine Cavarnos, Ph.D., The Hellenic-Christian Philosophical Tradition, Institute for Byzantine and Modern Greek Studies, 1989, Belmont, MA, EUA, p. 109-112.



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