Agora, quanto a um outro tema sobre o qual você escreve. Sobre desarmonias interiores, a dificuldade de viver. Acabei de ler (quase por acaso) Três anos de Tchekov. Talvez você também devesse lê-lo. Isso é a vida. Ela é mais profunda, mais ampla do que sua expressão exterior. Tudo nela muda. Tudo torna-se diferente. A principal coisa ? sempre e agora, parece-me ? é não identificar a vida com sua expressão exterior, e isso é tudo. Depois, escutando a vida (esta é a virtude mais importante, uma atitude relativamente passiva no começo), você encontrará em si mesmo, fora de você, em tudo, tanto que nenhum de nós tem condições de acomodar. Claro que não se pode viver sem dar, espiritualmente, um sentido à vida. Sem a filosofia (a sua própria filosofia de vida pessoal), pode haver niilismo, cinismo, suicídio, mas não vida. Mas todos têm a sua filosofia, é claro. Aparentemente, você tem de amadurecê-la em si mesmo, dar-lhe espaço dentro de você, porque ela conserva a vida em nós. Depois há a arte, para mim ? poemas, para outros ? música. Depois há o trabalho. Quantas coisas podem incitar uma pessoa a procura da verdade! Quanta luz interior, calor e apoio existem na busca em si! E, então há o mais importante ? a própria vida ? o céu, o sol, amor, pessoas, sofrimento. Isto não são simplesmente palavras, isto existe. É real. Está entrelaçado na vida. As crises não são fenômenos temporários, mas a estrada da vida interior. Quando passamos de sistemas, para destinos (pronunciar esta palavra é aterrorizante e prazeroso ao mesmo tempo, saber que amanhã iremos investigar o que está escondido atrás dela), para o nascimento e queda de sistemas, vemos isso com nossos próprios olhos. Estou convencido disso. Particularmente, todos nós, quando olhamos para nosso passado, vemos que estamos secando. Isto é correto. Isto é verdadeiro. Desenvolver-se é morrer. Isto é particularmente forte em épocas críticas ? com você, e novamente na minha idade. Dostoievski escreveu com horror sobre o ressecamento do coração. Gogol de forma mais horrorizada. É, na verdade, uma ?pequena morte? dentro de nós. E é assim que temos de aceitar. Mas por trás de tudo isso, está a vida, ou seja, movimento, viagem, seu próprio destino (Nietzsche ensinou o amor fati ? o amor por nosso destino). Mas já comecei a filosofar...
(Vygotsky em carta para Levina, datada de 16 de julho de 1931)