A Pesquisa em História
Ciências Humanas e Sociais

A Pesquisa em História




Luciana S. Melo
Pós-graduanda em História Social no Departamento de História /USP


VIEIRA, Maria do Pilar, PEIXOTO, Maria do Rosário, e KHOURY, Yara Aun. A Pesquisa em História. São Paulo, Ática, 1989. (Princípios - 159).

A História caracteriza-se pela longa luta do homem para compreender o meio em que vive e atuar sobre ele. A época atual tem evidenciado uma maior valorização da consciência dos fatos históricos. Deste modo, todas as manifestações humanas, quer de cunho literário ou provenientes da herança de uma memória coletiva, contém informações que devem ser estudadas e pesquisadas. Enfim, tudo o que o homem produz, ou produziu, torna-se objeto de reflexão e questionamento para o historiador.

É neste sentido que o livro encaminha a discussão sobre o papel dos documentos e da experiência humana dentro dos ramos da pesquisa, dando ênfase às etapas a serem seguidas no trabalho de um pesquisador. Nota-se, com isso, a preocupação das autoras em definir o papel do historiador frente aos fatos históricos: desde a descoberta cuidadosa e exaustiva das fontes, até à crítica da documentação, problematização e incorporação das mesmas à interpretação da história. Este livro propicia uma leitura bastante instrutiva aos profissionais que atuam na área de ensino e, principalmente, aos iniciantes na carreira acadêmica, interessados no campo da pesquisa como complemento à sua formação. Assim, apesar de sintética, a obra apresenta um conteúdo permeado por exemplos que ilustram o assunto e facilitam o entendimento do tema proposto.

Dentro da perspectiva e finalidade da obra, um primeiro ponto que despertou nosso interesse diz respeito à utilização das fontes históricas como objeto de estudo do historiador. Segundo as autoras, "...os registros da experiência humana não estão só nesses arquivos, museus e centros, mas por toda parte, ao alcance de todos", (p. 28, grifos nossos). Gostaríamos de evidenciar,, neste contexto, que esta frase engloba toda a postura inovadora em relação ao documento histórico, permitindo ultrapassar a concepção estreita de que as fontes históricas restringem-se ao texto escrito. Subentende-se, então, com este argumento, que principalmente o pesquisador brasileiro, cujo acesso a documentos oficiais quase sempre enfrenta dificuldades, pode beneficiar-se de outros registros (literatura, cinema, música, etc.) como fontes ou "materiais de suporte" para o desenvolvimento de sua pesquisa.

Porém, sentimos na obra a falta de maiores referências e indicações sobre as pesquisas realizadas fora dos centros acadêmicos. Também não houve, por parte das autoras, a preocupação em esclarecer de que modo atuam os historiadores que se dedicam à pesquisa em centros de documentação não oficial. Afinal, em nosso país, os vestígios da Historiografia vinculada aos antigos Institutos Históricos ainda não desapareceram inteiramente.

Outro ponto, com relação à pesquisa, que a nosso ver ficou sem esclarecimentos corresponde à atuação das instituições financiadoras de pesquisa, como a FAPESP e o CNPq, e todo o difícil processo pelo qual passa o pesquisador iniciante para conseguir uma bolsa de estudos. Na realidade além de métodos, o historiador necessita de condições, tanto no plano subjetivo quanto econômico, para desenvolver seu projeto de pesquisa.

Não podemos deixar de ressaltar uma sugestiva contribuição a nível de metodologia: a orientação, dada pelas autoras, a respeito dos cuidados que o pesquisador deve tomar com uma série de problemas (de ordem metodológica e prática) que se colocam durante a elaboração de sua pesquisa. Ressaltamos, aqui, a importância deste aspecto para o sucesso de uma pesquisa, pois a deficiência técnica, a insuficiência metódica e teórica, e até mesmo o ensino universitário podem ser responsáveis pela debilidade deste trabalho.

Também, através dos exemplos fornecidos pela experiência das autoras, destacamos um aspecto muito bem abordado, que é a reflexão sobre a interação do historiador com o meio social em que vive. No horizonte desta ótica, fica-nos explícito o importante papel da subjetividade e da influência do ambiente histórico e social na seleção dos fatos pelo historiador.

Finalmente, em último aspecto a destacar é a importância desta obra, não somente dentro da área de pesquisa, mas também na área educacional. Sob este prisma, a leitura deste livro traz, sem dúvida, grande contribuição para professores de 1º e 2º graus, pois uma inquietação que ainda paira sobre as cabeças de muitos profissionais é a de estimular os alunos a se interessarem pela História. Desta forma, passando por discussões sobre os objetivos da História enquanto ciência e, conseqüentemente, sobre o historiador e seu papel social, as autoras debatem a pesquisa e fazem um balanço bem objetivo da prática do historiador e das concepções de ciência nelas embutidas. Com isso, contribuem para uma atualização dos professores nos rumos da historiografia.

As autoras propõem, também, que a análise seja guiada pela percepção de que a História é uma "experiência vivida integral e socialmente", dentro de um "campo de possibilidades", e não um conhecimento pronto e acabado, sobre fatos sujeitados pelos métodos de pesquisa e interpretação. Assim, o livro induz à reflexão conjunta de alunos e professores e aponta direções para resgatar a unidade entre ensino e pesquisa. E esse pode ser um bom caminho para responder ao desafio de "fazer com que os alunos se interessem pela história".

Desta maneira, contendo análises úteis sobre o processo de pesquisa (dentro de uma perspectiva de reflexão e indagação), esta obra apresenta um amplo painel dos espaços de estudo do historiador. Não é apenas mais um manual ou um receituário de informações, mas um livro informativo, cuja consulta torna-se necessária para os que desejarem enveredar pelos caminhos do ensino da disciplina e da pesquisa histórica.

Revista de História - USP



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