Ciências Humanas e Sociais
Testemunho dos jovens de Hiroshima (I)
Testemunho de Tokuo Nakajima, rapaz, estava na 1ª classe em 1945
Estava ainda na cama, no dia 6 de Agosto, no momento em que a bomba caiu. Quando se ouviu a explosão, não consegui imaginar o que acontecera e ergui-me para ver. Tudo se encontrava na escuridão. Não consegui descobrir o que se passara e tentei sentar-me. Nesse mesmo momento as telhas do telhado tombaram e, pensando que alguma coisa sucedera, levantei-me. Nessa altura tanto o telhado como o tecto tinham desaparecido.
Uma das vizinhas aproximou-se e disse: «Queimar-te-ás até morreres se não fugires». Assim, fugi.
No caminho, a coragem faltou-me e parei. De súbito, compreendi que a minha mãe não se encontrava ali. Pensei que devia contar isto à minha mãe, e voltei pelo caminho por onde viera. Quando olhei para a nossa casa vi que desabara sobre o solo. A minha mãe deve estar fora, pensei; chamei mas não havia resposta. Tentei imaginar o que lhe acontecera.
Nesse mesmo momento surgiu outra senhora e perguntei: «Viu a minha mãe?»
Quando ela respondeu: «Não, não vi», fiquei desesperado.
Um homem que passava disse: «Se não te afastas depressa daqui queimar-te-ás até morreres. Vem afastemo-nos imediatamente».
Poré, procurava a minha mãe. No entanto, não a consegui encontrar em parte alguma, e enquanto tentava pensar no que devia fazer o mesmo homem disse:
«Procurá-la-ei por ti amanhã de manhã. Vamos.»
Tardei a encontrar uma resposta. Contudo, se não fosse, seria queimado até morrer; assim, fui por fim com ele.
«De momento, ficaremos bem se conseguirmos alcançar Elba», disse ele.
Alcançamos o vale e a ponte.
Em Eba, cresciam muitos tomates. Como não havia água toda a gente comia tomates.
Disse, como se falasse para mim mesmo: « Desejava muito encontrar bem cedo a Mãe».
Olhei em redor. Vi que o céu estava completamente escuro, que as casas estavam esmagadas e que as telhas tinham sido arrancadas pela força da explosão.
De todos os lados, vozes gritavam: «Socorro, salvem-me!»
Pessoas tão feridas que não lhes conseguia reconhecer a cara, clamavam: «Água, água!»
Naquela noite, adormeci por fim na colina. A cidade ardia intensamente e no céu a Lua parecia uma lanterna vermelha.
Na manhã seguinte voltei ao lugar onde estivera a nossa casa. Fiquei ali longo tempo, pensando que talvez a mãe, preocupada algures com o que me pudesse ter acontecido, voltasse aqui. E não vi a Mãe.
Os moribundos e os mortos estavam em Funairi. Pensei que talvez a Mãe se encontrasse entre eles e deu uma volta olhando cuidadosamente para a cara de todos, uma por uma, mas a Mãe não estava ali. Depois de ter vagueado durante longo tempo chguei à ponte de Meiji. Estava cheia de mortos, que jaziam por todo o lado. Não vi sinais da Mãe ali.
Cheguei à beira do rio. Esperei, chorando, mas por mais que esperasse não voltou. No rio, pessoas mortas flutuavam, chocando umas com as outras.
Passaram seis anos desde então. Agora, vivo em Matsubara.
Tenho o meu quinhão de guerra. Desejo apenas que façam a paz para ela permanecer para sempre no mundo.
Texto escrito em 1951, por Tokuo Nakajima
Reproduzido do livro « Testemunho dos Jovens de Hiroxima», ed. Portugália, 1965, tradução portuguesa do original «Children of the A-Bomb, the testamento f the boys and girls of Hiroshima»
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