Ciências Humanas e Sociais
Quilombo de Conceição das Crioulas
A saga das mulheres negras brasileiras pela liberdade, dignidade e protagonismo é exemplificada na fundação do quilombo Conceição das Crioulas, no sertão pernambucano, onde seis mulheres criaram o povoado fundamentado nesses princípios no início do século XIX.
Da lida na lavoura de algodão, o pequeno grupo deu origem a mais de 4 mil quilombolas que hoje lutam pela posse de mais de 17 mil hectares e desenvolvimento sustentável.
Da comunidade ConceiçãoA vocês quero falarOnde o povo descobriuUm jeito novo de trabalharFugindo da escravidãoAs crioulas aqui chegaramFiaram aquele algodãoE seu território compraramNão sabiam que assim estavamFazendo seu artesanatoPovo simples de pequena culturaO ofício que sempre desempenharamSe antes alguém viu como insignificantesVejam agora um povo vitoriosoQue se assumem como negrosBem felizes e importantes
Conceição das Crioulas é uma pequena comunidade no Pernambuco com cerca de 4 mil remanescentes de quilombos. Um detalhe: a grande maioria descende também de índios. Sua população vem resistindo à miséria ao longo dos anos. Ainda hoje, quando precisam de um médico ou algum outro serviço em Salgueiro, a cidade mais próxima, os moradores têm de pagar 9 reais pela viagem de ida e volta na carroceria de um caminhão, em cima da carga. O transporte sai só alguns dias por semana, pela manhã, e volta à tarde para a comunidade. A estrada é de chão batido e o lugar de difícil acesso. Para quem muitas vezes passa mais de um mês sem ver uma nota de 1 real, o preço da passagem é inacessível.A comunidade fica no chamado "Polígono da Maconha", onde persistem os casos de trabalho escravo em grandes propriedades que cultivam a erva e a grilagem de terras quilombolas. Outro problema enfrentado pelos moradores de Conceição das Crioulas é o abastecimento de água. A lagoa de onde a população tira a água para consumo está praticamente seca. Os animais são raquíticos. Não há condições para plantar, mas as mulheres não esmorecem: saem de casa às 5 da manhã em direção a uma roça distante, onde, de forma comunitária, plantam milho e feijão de corda. Por volta do meio-dia elas estão de volta com sacos imensos e pesados nas costas. São mulheres de 50, 60, 70 anos que, ao chegarem da roça, passam a trabalhar como artesãs. Isso porque as mulheres da comunidade fazem do caroá, catulé (plantas típicas da região) e barri a matéria-prima para produzir bolsas, bonecas, tigelas e pratos.Quilombo de mulheres Mas se o cenário de seca impressiona quem chega a Conceição das Crioulas, a generosidade de seus moradores é um contraponto. Eles têm prazer em receber os visitantes em suas casas, oferecer com gosto um copo de umbuzeiro, contar como vivem, as dificuldades, as histórias quilombolas, a paixão pelo Esporte Clube Palmeiras - de cada 10 casas visitadas em Conceição das Crioulas, pelo menos 7 trazem na sala uma foto do time paulista.A presença das mulheres na comunidade é histórica. Conceição teve início quando as escravas Francisca, Germana e Mendeira, fugidas dos Quilombos dos Palmares, em Alagoas, chegaram à região, no século 18. Daí em diante, é a força das mulheres que faz a diferença nesse distrito. Uma delas, Aparecida Mendes, coordenadora da Associação Quilombola de Conceição das Crioulas - fundada em julho de 2000 e formada por 10 associações de produtores e trabalhadores rurais vindos de diversas partes de Conceição -, roda o mundo levando a história de sua comunidade. Agora, o lugar está ganhando um presente valioso: a primeira biblioteca. Para isso, uma campanha está sendo realizada para que livros sejam mandados ao local, já que são pouquíssimos os exemplares por enquanto. Toda publicação é bem-vinda, mandam dizer os moradores. HistóriaContam os mais velhos que, no início do século XIX, seis negras livres chegaram à região e arrendaram uma área de 3 léguas (1 légua = 6 km) em quadra. Com a produção e fiação do algodão que vendiam na cidade de Flores, conseguiram pagar a renda e ganharam o direito à posse das terras. Em 1802, as crioulas receberam a escritura com o carimbo da Torre, dezesseis selos, feita por José Delgado, escrivão do cartório de Flores.Esta história é contada nos mais diversos sítios, ligando a identidade da comunidade de Conceição das Crioulas à descendência das suas fundadoras, que através do trabalho tomaram a iniciativa de legitimar o terreno, antes mesmo dos homens que também aqui vieram.Um deles de nome Francisco José, fugido da guerra, trouxe consigo uma imagem de Nossa Senhora da Conceição. Ao encontrar-se com as crioulas, tiveram a idéia de construir uma capela e tornar a santa sua padroeira. Surgia assim o nome do povoado: Conceição das Crioulas.A identidade quilombolaA identidade de "remanescente de quilombos" está intrinsecamente relacionada à origem das crioulas e às relações de cooperação entre os sítios que formam a comunidade. A descendência de determinadas famílias tradicionais é sempre resgatada de forma a confirmar o pertencimento e a participação na história de Conceição das Crioulas.Ao contrário de outras comunidades negras que ainda lutam pelo reconhecimento como "remanescente de quilombos", Conceição não se utiliza de elementos que reportem à condição de escravos. Sempre a imagem das crioulas lembra o poder da autonomia e a articulação entre os sítios, reforçando o sentido de unidade e sua capacidade política-organizativa.Tudo isso torna o povo de Conceição ciente da sua condição e do seu papel na sociedade, trazendo comprometimento com a construção de um novo futuro para a comunidade quilombola. A economia que vem da terraEm meio a uma vegetação composta por árvores de pequeno e médio porte, como juazeiro, baraúna, jurema preta, aroeira, caroá, catulé, está o povoado de Conceição das Crioulas. Até 1987 o algodão foi o sustentáculo da economia quilombola, mas com o ataque da praga do bicudo e a entrada dos fios sintéticos, a população assistiu a sua decadência. Hoje, através de uma agricultura de subsistência, seus habitantes sobrevivem plantando milho, feijão, mandioca, jerimum e melancia. Há também pequenos criatórios de ovinos, caprinos, bovinos e suínos.
Com o sucesso da ação voltada para a valorização e desenvolvimento do artesanato, três recursos naturais ganharam destaque, como o caroá, o barro e o catulé.
O caroá é uma bromélia da espécie neoglaziovia variegata que fornece uma fibra para tecelagem. De caule curto, o caroá possui espinhos em sua borda, com folhas dispostas em roseta. Em meados do século XX, existiu uma fábrica de caroá em Conceição, mas foi desativada com a concorrência do sisal.O barro está presente até os dias atuais nos utilitários do povo de Conceição. Até a década de 50, aproximadamente, usava-se apenas louças de barro. Muitas dessas peças eram vendidas em feiras e lojas da cidades circunvizinhas como Cabrobó, Floresta e Salgueiro, em pequenos povoados e por encomenda de famílias influentes. Conhecidas como louceiras, as mulheres que trabalham com o barro pertencem todas a mesma família consangüínea e agregados através do matrimônio.Palmeira silvestre da espécie rhapis pyramidata, bem comum no sertão, o catulé fornece uma amêndoa de onde se extrai óleo. A sua palha é aproveitada no artesanato, transformando-se em chapéus, cestas, bolsas, etc. Em Conceição, a palha de catulé sempre esteve presente na produção de vassouras e esteiras, sendo considerada, até o momento, uma atividade tipicamente dos mais velhos. Associação quilombolaFundada em 17 de julho de 2000, a Associação Quilombola de Conceição das Crioulas é uma sociedade civil sem fins lucrativos formada por 10 associações de produtores e trabalhadores rurais provenientes dos diversos sítios que compõe o povoado.Nascida da necessidade de intensificar a luta pelo bem comum de Conceição das Crioulas, a AQCC tem com objetivos o desenvolvimento da comunidade - levando em conta sua realidade e sua história, a valorização das suas potencialidades, a conscientização do povo negro da sua importância para construção de uma sociedade justa e igualitária, a quebra da barreira do preconceito e discriminação racial. No momento, o maior empenho da Associação Quilombola é a batalha pela posse da terra, com área aproximada de 17.000 hectares, numa perspectiva sustentável.A estrutura de funcionamento se dá através da Coordenação Executiva e de comissões formadas pelas lideranças da comunidade e, até o momento, a ACQC vem se mantendo com o trabalho voluntário dos seus sócios, não possuindo recursos financeiros suficientes para a sua perfeita atividadeMulheres Guerreiras
Mulheres guerreiras
Chegaram em Conceição
Pra conseguir a liberdade
Plantaram algodão
O grande sonho
Virou verdade
Com força e união
Conquistaram a liberdade
Então os fazendeiros
Ricos e opressores
Invadiram Conceição
Se tornaram dominadores
Mas o povo de Conceição,
Meu irmão
Demonstraram
Resistência
E continuam resistindo
A todo o tipo de violência
Hoje a comunidade
É organizada
Busca seus direitos
Com força e coragem
Durante muito tempo
A educação
Foi um forte instrumento
A favor da opressão
É por isso que
Defendemos
Uma educação diferente
Que inclua nos currículos
A história da genteVer e consultar:
http://www.conceicaodascrioulas.org.br/
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