O Pesadelo de Darwin ( um filme recém-estreado, a não perder)
Ciências Humanas e Sociais

O Pesadelo de Darwin ( um filme recém-estreado, a não perder)


título original : Darwin's Nightmare

«O Pesadelo de Darwin» é um documentário realizado pelo austríaco Hubert Sauper em 1996 que foi premiado numa série de festivais.
O cineasta dispôs-se a filmar a vida dos habitantes das margens do Lago Victoria, na Tanzânia, considerado o berço da Humanidade, que é hoje palco do pior pesadelo da globalização.


A miséria, a fome e a sida são males comuns para quem vive nesta região do mundo, mas a par desta realidade, existe outra. A enorme riqueza piscícola desse mesmo lago é explorada pela mão-de-obra local, mal paga, ao serviço de empresas estrangeiras que exportam filetes de peixe, sobretudo para a Europa. Para a alimentação dos habitantes locais restam as cabeças de peixe e pouco mais.Esta lucrativa indústria nasceu depois de um predador voraz, a perca do Nilo, ter sido introduzido no maior lago tropical do mundo, nos anos 60, como experiência científica.

Como resultado, praticamente todas as espécies autóctones de peixes foram dizimadas, e a partir da catástrofe ecológica nasceu um negócio «chorudo», com base na exportação da carne branca do enorme peixe para todo o hemisfério norte.

Hubert Sauper estende ainda a sua crítica ao serviço prestado pelos aviões no transporte de armas que alimentam os conflitos, frequentes nos países mais próximos, alimentando um dos males que mais tem minado o desenvolvimento do continente africano.Pescadores, políticos, pilotos russos, prostitutas, industriais e comissários europeus são «actores» de um drama que ultrapassa as suas fronteiras geográficas para se inscrever nos territórios da humanidade.

Conforme revela o realizador nas notas de intenções do filme, a ideia para este filme nasceu durante a investigação para outro documentário - «Kisangani Diary - Loin du Rwanda», sobre os refugiados da revolução no Congo. «Foi em 1997 que fui testemunha pela primeira vez do tráfico destes enormes aviões. Enquanto um avião chegava da América com comida para os refugiados dos campos da ONU, um segundo avião descolava para a União Europeia com 50 toneladas de peixe a bordo, revela.«O encontro e os laços de amizade que estabeleci com alguns dos elementos da equipa de um dos aviões de carga russos permitiram-me descobrir o impensável. Os aviões não traziam só ajuda humanitária dos países desenvolvidos, mas também traziam armas. Os aviões traziam a comida que os alimentava durante o dia e as armas que os matavam à noite», detalha o cineasta. «Conhecer a cronologia e os rostos de uma realidade tão cínica tornou-se o objectivo de O Pesadelo de Darwin», conclui.

Colocando o «dedo na ferida», Sauper lança ainda uma questão: «Porque será que sempre que um recurso natural é descoberto, os habitantes desse local morrem na miséria, os filhos tornam-se soldados e as filhas criadas ou prostitutas»?

Para o autor é claro que «depois de centenas de anos de escravatura e colonização em África, os efeitos da globalização estão a infligir humilhações mortais aos habitantes». Por isso avisa: «A atitude arrogante dos países ricos no que diz respeito ao Terceiro Mundo cria perigos futuros para todos os povos».Mesmo sendo trabalhado como documentário, o filme tem bastante ritmo, o que permite que a narrativa visual se acompanhe sem grande esforço, mesmo que, no final, nos deixe com um sentimento de tristeza por percebermos o longo caminho que falta percorrer para vivermos num mundo mais justo.

«O Pesadelo de Darwin» ganhou o Prémio de Melhor Documentário nos Prémios Europeus do Cinema e foi ainda premiado nos festivais de Veneza, Belfort, Copenhaga, Montréal, Paris, Chicago, Salónica, Oslo, México, Angers.

Texto retirado de:
http://www.estreia.online.pt/aleph/envelope?filme+ficha:list_movie:1649


Breve Revista de Imprensa sobre o filme:


Será difícil depois de ver O PESADELO DE DARWIN comer uma perca do Nilo sem que uma espinha nos pique… A partir da carne branca deste peixe pescado no lago Vitória, o realizador mostra o encadeamento dos "danos colaterais" provocados pela exploração intensiva de uma riqueza natural num país pobre, que poderia ser em África ou não. Hubert Sauper insiste: o filme também poderia ser sobre os diamantes da Serra Leoa ou o petróleo de Angola... Ele limitou-se a filmar numa cidade como existem várias, para conseguir um filme negro e surpreendente. Mwanza, 500 000 habitantes, margens do lago Vitória, na Tânzania. A perca do Nilo foi introduzida nos anos 60 e a indústria da pesca prosperou à volta deste peixe e toda a região ficou dependente. Dez fábricas exportam todos os dias filetes frescos, nomeadamente para a Europa.Poucos lucram com este comércio. E os aviões russos que transportam os peixes transportam igualmente armas para os países vizinhos, as prostitutas tratam dos pilotos russos, os camponeses deixam as suas terras para se instalarem nas margens do lago, a sida propaga-se, as crianças drogam-se com componentes das embalagens de peixe, e os habitantes comem poucas proteínas porque o peixe se tornou demasiado caro...SYLVIE BRIET E LAURE NOUALHAT, LIBÉRATION


O PESADELO DE DARWIN parece-se mais com um fragmento de "O Juízo Final", de Bosch, do que com um filme de Michael Moore. Hubert Sauper, tal como o pintor holandês, compôs a sua visão do mundo com detalhes. (...) Planos perturbadores e sequências espantosas que amplificam como num thriller a demonstração filmada e anunciada de Sauper: "Não teríamos percas do Nilo nos nossos supermercados se não houvesse guerra e fome em África".Mas Sauper não é apenas militante ou jornalista, é visivelmente um cineasta. E é com grande habilidade que se distingue do grupo de "documentários-choque" que abundam actualmente. (...)Sauper não se fica pela força da demonstração em imagens, entrevistas e comentário; ele serve-se também de procedimentos de cinema para meter o espectador numa condição de extrema perturbação. ANNICK PEIGNÉ-GIULY, LIBÉRATION


É um soberbo documentário. Pertubador e obsceno. Das percas do Nilo que pululam no lago, os habitantes da Tanzânia só vêem os restos. Carcassas esventradas, podres. Nenhuma esperança. Nenhum futuro. O único sonho de uma das testemunhas interrogadas por Hubert Sauper é que o seu filho se torne piloto. Que nesta cadeia infernal isso lhe permita escapar ao inferno. (…) O sistema é circular. O pesadelo continua. Mas graças a este filme sabemos que existe.PIERRE MURAT, TÉLÉRAMA


O escândalo da situação africana e a responsabilidade passada e presente das potências ocidentais neste estado são sobejamente conhecidos. Se vários filmes já denunciaram esta situação, não se encontram muitos que o façam tão eficazmente, tão profundamente e que acordem tão violentamente a consciência do espectador. (...) Numa palavra, o filme do austríaco Hubert Sauper mostra com as armas do cinema (comparando imagens e confrontando planos) cem vezes mais e cem vezes melhor que qualquer retórica militante. (...)Ninguém sairá deste filme incólume.J.M., LE MONDE


É a quadratura do círculo, uma obra total, sem falhas, que não só agradará aos militantes das causas humanitárias, mas também aos cinéfilos. O filme é terrível, perturbador, tantos são os horrores que concentra - e esplêndido pela sua forma inventiva, que não se inscreve em nenhuma lógica linear e consegue tratar todos os temas de forma pessoal e profunda. (...)Toda a África parece concentrada nesta visão apocalíptica. Raramente vimos expresso tanto desespero com tanta graça. VINCENT OSTRIA, LES INROCKUPTIBLES


Consultar ainda :

http://www.hubertsauper.com/

http://www.coop99.at/darwins-nightmare/

http://fr.wikipedia.org/wiki/Le_Cauchemar_de_Darwin



NOTA: foi realizado entretanto um documentário realizado por Margaret Nakato ( vice-presidente do Fórum Mundial dos pescadores) sobre a reacção dos pescadores Katosi, aldeia ugandesa situada nas margens do lago Victória, onde foi rodado o filme «Pesadelo de Darwin» de Hubert Sauper, aos factos que são denunciados através do referido filma. Esse documentário pode ser já visto. Para o descarregar pelo sistema peer-to.peer como eMule pode-se ir a:
http://www.clmayer.net/spip/IMG/rm/katosi.rm
http://www.clmayer.net/spip/IMG/wmv/katosi.wmv

Ou contactar:

Katosi Women fishing & Development Association
P.O Box 33929
Kampala, Uganda
East Africa
[email protected]



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