o Brasil e o Tratado de Madrid (1735-1750)
Ciências Humanas e Sociais

o Brasil e o Tratado de Madrid (1735-1750)



Tiago Costa Pinto dos Reis Miranda
Pós-Graduando em História Social/USP

ALMEIDA, Luís Ferrand de Alexandre de Gusmão, o Brasil e o Tratado de Madrid (1735-1750). Coimbra, Instituto Nacional de Investigação Científica/Centro de História da Sociedade e da Cultura/ Universidade de Coimbra. 1990 66 p. ("História Moderna e Contemporânea",5).

O tumultuado processo de delimitação das fronteiras meridionais da América portuguesa no século XVIII conta com uma bibliografia polêmica e variada, principalmente se nela se incluírem os trabalhos sobre a experiência missionária da Companhia de Jesus e os incidentes que se seguiram às negociações do Tratado de Madrid. Em muitos casos, as controvérsias perpetuam a manifestação de diferentes sensibilidades religiosas e nacionais, amparadas em raciocínios algo maniqueístas, coleções documentais freqüentemente restritas ou material historiográfico por demais homogêneo. O presente volume, embora tendendo a centrar-se no estudo de um personagem, ilustra os bons resultados que se podem alcançar quando se conseguem iludir essas graves limitações.

Professor do Instituto de História Econômica e Social da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Luís Ferrand de Almeida é um profundo conhecedor dos reinados de D. Pedro II e D. João V. Seus textos encerram uma experiência acumulada no correr de mais de quarenta anos de investigação, em Portugal e no estrangeiro, com destaque para a leitura dos núcleos da velha Torre do Tombo e do Arquivo Histórico Ultramarino. Boa parte da obra que publicou constitui-se de resenhas e artigos em revistas especializadas, onde, por vezes, contradiz frontalmente algumas das imagens negativas sobre o século XVIII que a reação "liberal" ajudou a sedimentar (veja-se, como exemplo, a análise do "Testamento Político" de D. Luís da Cunha, no vol. III da Revista Portuguesa de História, em 1951). Na década de sessenta, colaborou no Dicionário de Joel Serrão. A Diplomacia Portuguesa e os Limites Meridionais do Brasil (1957) e A Colônia do Sacramento na Época da Sucessão de Espanha (1973) encontram-se entre os seus trabalhos mais volumosos.

Alexandre de Gusmão, o Brasil e o Tratado de Madrid inicia-se com uma retomada do conflito de 1704 em torno da bacia do Prata, e do acordo que mais tarde se estabeleceu em Ultrecht, para o reconhecimento do "Território, & Colonia do Sacramento" como pertença da Coroa portuguesa. Após assinalar as principais referências do qadro econômico da região, o autor narra o recrudescimento da animosidade luso-espanhola a partir de 1733, tendo sempre em vista as alterações conjunturais do equilíbrio europeu. Assentes estes elementos, apresenta Alexandre de Gusmão: primeiro, o curso acadêmico e a carreira diplomática; depois, a fixação na corte, assumindo responsabilidades no despacho dos negócios estrangeiros e dos assuntos coloniais. A partir dos seus papéis, relembram-se os instantes de esmorecimento da aliança com a Inglaterra (1736 e 1740-1), os diversos esforços para uma maior proximidade entre Lisboa e Paris, e, enfim, a oportunidade de um acordo político e territorial com a Espanha de Fernando VI (1746 - 1750).

Um dos aspectos mais interessantes deste trabalho é a tentativa de periodizar com clareza o grau de influência de Alexandre de Gusmão junto ao trono de Bragança. Contrariamente a estudiosos como Pedro Soares Martínez (História Diplomática de Portugal. Ed. Verbo, Lisboa. 1986, p. 244-246), ó autor acaba por confirmar, com base em vários testemunhos, que o secretário de D. João V teve um papel de destaque na condução de assuntos internacionais a partir de 1731 e, especialmente, entre 1735 e 1737. Depois de uma fase que Jaime Cortesão já denominara de "eclipse parcial" (1740-1744), voltou à primeira linha da política externa, coordenando a equipe portuguesa que negociaria o Tratado de 1750.

A análise de Ferrand de Almeida estende-se um pouco além da anulação das fronteiras; em 1761, concretizada num texto que a médio prazo se revelaria prejudicial aos interesses de Lisboa nas regiões de Santa Catarina e do Rio Grande. A sorte desses territórios viria a decidir-se durante a guerra que no início do século XIX anulou, de fato, os termos do Tratado de Badajós.

Apesar de relativamente breve, trata-se de um livro construído sobre bibliografia ampla e atual, citada com impressionante cuidado. Aconselhável a quem deseje compreender a atuação da diplomacia portuguesa, no Brasil Colônia, para além de esquemas redutores.

Revista de História - USP



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