Le Géant, la Licorne e la Tulipe - Collections françaises au XVII siècle"
Ciências Humanas e Sociais

Le Géant, la Licorne e la Tulipe - Collections françaises au XVII siècle"




Henrique Carneiro
Pós-graduando em História Social no Departamento de História/USP

SCHNAPPER, Antoine. Le Géant, la Licorne e la Tulipe - Collections françaises au XVII siècle", Paris, Flammarion, 1988.

Inventário de inventários, essa história das coleções do século XVII mostra como a curiosidade moderna reúne, dos três reinos da natureza, os mais híbridos exemplares - pedras, animais, corais, mandrágoras de forma humana - em resumos do mundo, microcosmos da cosmografia curiosa da época, que são os cabinets.

Coleções de curiosidades no bojo da modernidade taxionomizante, os cabinets franceses eram móveis de madeira talhada cujas prateleiras expunham ao olhar fascinado as suas peças: fósseis, âmbar, objetos petrificados, pedras bezoares, imãs, tulipas, herbários, conchas, pedaços de múmia, chifres de unicórnio.

Nesses museus particulares, constituídos pelos caprichos de aristocratas colecionadores, grandes príncipes ou poderosos, nascia a história natural. No recolhimento dos objetos mais remotos, mais caros e mais bizarros, revelava-se também o espírito nascente do enciclopedismo. Junto às coleções de arte, de antiguidades e de medalhas manifestaram-se nas wunderkammer - câmaras de maravilhas - ou cabinets aquilo que K. Pomian chama de semióforos: objetos exóticos, antiguidades e objetos artísticos guardados como signos para o olhar. Coleção, para Pomian, é "um conjunto de objetos naturais ou artificiais mantidos temporária ou definitivamente fora do circuito de atividades econômicas, submetidos a uma proteção especial num lugar fechado destinado a esse fim e exposto ao olhar".

Criticando essa noção que abrangeria também os objetos religiosos, Schnapper realizará uma minuciosa investigação para ironizar a ingenuidade daqueles que - como Müntz, que em 1808 publicou o inventário dos Médicis no século XV - acreditavam que os redatores da época não sabiam avaliar preços, pois um chifre de unicórnio era avaliado em 6 mil florins e un Van Eick em apenas 30.

Eis um livro indispensável para se entender, entre outras coisas, porque o que existia de mais caro no século XVI eram o âmbar gris e a pedra bezoar."O gigante, o Unicórnio e a Tulipa - Coleções francesas no século XVII" com cinco capítulos, seguidos de ilustrações, dá conta inicialmente do reino mineral e vegetal, onde conhecemos as teorias de formação das pedras, as dificuldades de classificação do coral, as glossopedras, a Rosa de Jericó, os jardins botânicos, as flores e os frutos. O segundo capítulo abrangerá o mar e seus frutos equívocos, como a rémora ? pequeno peixe que possuiria o poder de deter os navios -, as conchas; os pássaros, dentre os quais se destacavam os colibris e as aves-do-paraíso; os insetos; e os animais lendários - a hidra, os dragões, o basilisco, o unicórnio e os gigantes. Nesses pavilhões de maravilhas brotava a ornitologia, a malacologia e a botânica modernas.

No terceiro capítulo, conheceremos as coleções das jóias sábias, os colecionadores de livros raros, de medalhas, de antiguidades. Recantos sombrios de gavetas de escrivaninhas onde misturam-se a heráldica do passado com a numismática moderna. Essa filatelia espiritual esculpiu o caráter do homem moderno como um insaciável devorador de novidades e de raridades, amante do desconhecido e armazenador dos segredos do mundo.

As figuras particulares de grandes colecionadores, como Gaston d'Orléans, irmão de Luís XIII; de Loménie de Brienne, Pierre Borel e Peiresc, entre outros, do período de 1594-1660, serão apresentadas no penúltimo capítulo, que nos introduzirá, enfim, na corte do Rei Sol.

Luis XIV e a história natural, a corte e os eruditos, colecionadores e marchands, concluem esse panorama que descortina um dos tesouros da formação do Ocidente e da modernidade. Oscilando entre os polos do ceticismo e da credulidade, os gabinetes expõem a história da curiosidade, a ciência das medalhas, a arqueologia dos símbolos, miniaturas da expansão colonial, pedaços da pilhagem dos novos mundos guardados como jóias nos armários dos nobres, como um luxo novo entre os muitos antigos, um luxo exótico que logo será sistematizado pelo saber moderno das ciências naturais.

Revista de História - USP



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